O voo entre Reykjavík e Kulusuk já é, por si só, uma experiência memorável. À medida que o pequeno turbo-hélice se aproxima da costa, vês os primeiros icebergs a deslizar no mar, mesmo por baixo das asas. Ao desceres para a pista de terra batida, percebes de imediato que estás prestes a explorar um lugar único. À tua espera estará o guia de trekking, pronto com uma moto-quatro para transportar as bagagens até à praia, onde o barco já nos aguarda para a travessia até Tasiilaq, onde passaremos as próximas duas noites. As refeições em Tasiilaq serão preparadas pelo grupo, na cozinha da nossa casa. Uma primeira oportunidade para conhecer melhor os companheiros de viagem e entrar no espírito colaborativo que vai marcar esta jornada.

Alimentação: -
Dormida: Albergue

Este dia serve como margem de segurança caso o voo do dia anterior tenha sido afetado pelo clima, algo relativamente frequente nesta região, e também para prepararmos o equipamento. Vamos ao nosso depósito buscar o material de acampamento e cozinha, confirmar que tudo está em boas condições após o inverno e dedicar algum tempo a aprender a montar as tendas e a organizar o teu saco Sherpa para o trekking. Durante a tarde, podemos explorar Tasiilaq a pé ou simplesmente ficar a observar os icebergs que atravessam lentamente a baía. É um dia para absorver o ambiente e o ritmo tranquilo desta vila remota na orla do Ártico.

Alimentação: -
Dormida: Albergue

De manhã, embarcamos num pequeno barco que nos leva até ao fiorde de Karale. Durante duas horas, navegamos por águas geladas, entre escarpas de granito e blocos de gelo à deriva. Ao desembarcarmos, estamos rodeados por três glaciares imponentes e montamos o nosso primeiro acampamento com vista direta para o glaciar Knud Rasmussen. É aqui que nos desconectamos do mundo exterior e sentimos o peso do isolamento ártico. Durante a tarde, podes optar por ficar no acampamento a absorver o ambiente ou fazer uma pequena caminhada pela praia.

Alimentação: -
Dormida: Tenda

Acordamos cedo, preparamos o pequeno-almoço, arrumamos as mochilas, desmontamos o acampamento e começamos a caminhar. Este passa a ser o nosso ritual diário ao longo da travessia. Na costa leste da Gronelândia não existem trilhos marcados, e esta ausência obriga-nos a abrandar e a focar no essencial: o corpo, o terreno, o grupo e o momento. O primeiro dia de trekking é também um dos mais exigentes da nossa travessia, levando-nos a subir até um ponto elevado, de onde temos uma vista de pássaro sobre os fiordes, as montanhas e os glaciares que nos rodeiam. Ao final do dia, descemos até à praia dos icebergs, onde montamos o acampamento e ficamos a assistir ao espetáculo dos blocos de gelo à deriva.

Distância: 9 km (8 horas)
Desnível: 590 m positivo + 590 m negativo 

Alimentação: -
Dormida: Tenda

Avançamos pelo terreno selvagem, procurando sempre o caminho de menor resistência. Os rios glaciares que correm para o mar tornam-se obstáculos inevitáveis que temos de atravessar ao longo do percurso.
No final do dia, chegamos à antiga base aérea Bluie East 2, um lugar onde o tempo parece ter parado. Construída durante a Segunda Guerra Mundial, hoje restam hangares e depósitos de combustível enferrujados, espalhados pela costa deserta. Entre estas estruturas esquecidas, a paisagem ártica impõe-se e cria um contraste que parece servir de alerta para um futuro desolado. Montamos o acampamento junto à água e, para os mais ousados, há tempo para um mergulho rápido na água gelada.

Distância: 11 km (7 horas)
Desnível: 150 m positivo + 140 m negativo

Alimentação: -
Dormida: Tenda

Caminhamos, sempre com os icebergs a acompanhar-nos nas águas tranquilas, até à confluência de dois fiordes. Hoje temos de ultrapassar um extenso delta glacial. Dependendo do caudal, a travessia pode ser feita a pé, com a água a subir até à cintura, ou de barco, caso as correntes estejam demasiado fortes.
Ao final do dia, montamos acampamento em frente a uma montanha marcada por um glaciar suspenso, que domina a paisagem e torna este um dos locais mais memoráveis da travessia.

Distância: 14 km (5 horas)
Desnível: 120 m positivo + 100 m negativo

Alimentação: -
Dormida: Tenda

Deixamos a costa e avançamos por um vale profundo, ladeado por paredes rochosas que se erguem a mais de 1.500 metros de altura. À medida que caminhamos, as encostas tornam-se cada vez mais verticais e os glaciares descem dos cumes, formando línguas de gelo que se estendem até ao vale. A meio do dia, teremos de ultrapassar um desses glaciares, por cima do gelo, numa ponta terminal do manto de gelo da Gronelândia, a segunda maior massa de gelo do planeta. É uma experiência que nos faz sentir a verdadeira escala desta paisagem e a nossa própria pequenez perante a imensidão do terreno. Depois de um dia exigente, alcançamos um novo fiorde e montamos o acampamento com o Fox Jaw Cirque a dominar o horizonte.

Distância: 14 km (9 horas)
Desnível: 170 m positivo + 180 m negativo

Alimentação: -
Dormida: Tenda

Avançamos até ao fundo do fiorde, sempre com o Fox Jaw Cirque a dominar o horizonte. Estas torres de granito erguem-se abruptamente no extremo sul dos Schweizerland Alps, uma cordilheira isolada e altamente glaciada que tem fascinado exploradores desde o início do século XX. O nome “Schweizerland” foi dado em 1912 pelo geofísico e explorador suíço Alfred de Quervain, após atravessar a calote de gelo da Gronelândia na sua Segunda Expedição Suíça. As encostas verticais e o acesso desafiante transformaram o Fox Jaw Cirque num dos grandes palcos de escalada do Ártico. As rotas abertas aqui, pela sua dificuldade técnica e isolamento, são frequentemente comparadas às grandes paredes de granito da Patagónia ou do Paquistão. Ao final do dia, montamos o último acampamento da travessia com estas torres como pano de fundo.

Distância: 8 km (5 horas)
Desnível: 40 m positivo + 50 m negativo

Alimentação: -
Dormida: Tenda

O objetivo do dia é exigente: alcançar uma cabana situada na orla do glaciar de Karale, bem acima do vale. Este refúgio serve de base para expedições de ski e alpinismo e encontra-se isolado num cenário impressionante, de frente para o glaciar e com vistas para picos afiados e vales profundos.
Deixamos o fiorde e caminhamos por um vale verdejante até à orla de um glaciar, que subimos pela moreia que o acompanha. Um trilho de pedra, com alguns rios para atravessar, dá lugar a uma subida vertiginosa, recompensada pela chegada a um dos locais mais remotos e imponentes da Gronelândia.

Distância: 9 km (7 horas)
Desnível: 700 m positivo

Alimentação: -
Dormida: Refúgio

Descemos da montanha e caminhamos de volta ao fiorde, onde aguardamos a chegada do barco que nos levará de regresso a Tasiilaq. O dia tem um sabor agridoce: deixamos para trás o isolamento e a grandiosidade da montanha, mas aproxima-se a promessa de um banho quente e de uma refeição reconfortante na nossa casa. À noite, reunimo-nos à volta da mesa para partilhar a última refeição em grupo. Entre risos e histórias, celebramos a jornada concluída e a oportunidade rara de ter caminhado por uma das paisagens mais selvagens e intactas do planeta.

Distância:  10 km (6 horas)
Desnível: 700 m negativo

Alimentação: -
Dormida: Albergue

Despedimo-nos da Gronelândia e iniciamos a viagem de regresso. Consoante o horário do voo para Reykjavík, seguimos de barco até Kulusuk, atravessando uma última vez as águas geladas, navegando por onde baleias surgem por vezes à superfície, como uma derradeira despedida. A aventura termina com a sensação de termos vivido algo verdadeiramente único.

Alimentação: -
Dormida: -